Em 2021, o SOS Corpo Instituto Feminista para a Democracia (membro da AFM) celebra 40 anos de sua fundação. Para esse momento organizou uma programação que teve o Seminário como evento de abertura das comemorações.
Nos dias 10 e 11 de junho, aconteceu a primeira parte do Seminário dos 40 Anos do SOS Corpo, atividade que inaugurou o ano de programação de atividades que marcam 2021 para o Instituto Feminista para a Democracia. Nas duas noites de transmissão ao vivo, o Seminário que teve como tema “Mulheres Insurgentes Pela Vida e Por Democracia”, reuniu mulheres de movimentos sociais que tem construído ao longo dos anos, a luta e a resistência do movimento feminista e do movimento de mulheres no Brasil.
Na primeira noite, no dia 10 de junho, o evento contou com a participação de Maria Betânia Ávila, socióloga, integrante fundadora do SOS Corpo e ativista feminista da Articulación Feminista Marcosur (AFM), que fez a fala de abertura da noite, situando a importância da luta feminista no curso do devir histórico.
“Entendo o movimento como um devir contraditório, dialético que se expande e se democratiza e, como diz minha querida filósofa, Sueli Carneiro, tem que enegrecer, e está enegrecendo, cada vez mais. O feminismo se expande, os sujeitos feministas estão nos campos, nas florestas, nas cidades, onde sujeitas insurgentes constroem lutas e dão sentidos novos a sua práxis. As mulheres trans, que trazem esse aporte imenso ao pensamento e luta feminista – tornando-o inlusive mais radical”, salientou Betânia Ávila.
Uma das convidadas para o debate da primeira noite foi Sarah Marques, do Coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste. O Coletivo atua em defesa do direito à cidade, por moradia e contra a especulação imobiliária que ameaça a comunidade de tradição pesqueira Caranguejo Tabaiares, que existe há 110 anos na região da zona oeste da cidade do Recife. Sarah Marques lembrou que a maior insurgência que as mulheres podem realizar é celebrar a vida e manter a luta, mesmo diante das forças de morte que estão no poder.
“Insurgir é a gente conseguir comemorar a vida, porque eles não nos querem vivas. Eles combinaram de nos matar. Eles combinaram que é uma política de morte, que a gente tem pessoas morrendo mesmo tendo vacina para esta doença. É uma política de morte quando em uma comunidade de cinco mil pessoas, a gente só tem uma equipe de saúde da família”, destacou a ativista.
Também para o debate da primeira noite, Atiliana Brunetto, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), trouxe as experiências da luta insurgente das mulheres do MST, que com a luta em defesa da terra, por moradia e por comida, escancarou as desigualdades sociais provocadas pelo agronegócio.
“A garantia da vida pela qual nós lutamos perpassa, principalmente, por terra, teto e pão. Nossa luta por comida passa por pensarmos que em 2020 58 milhões de brasileiros se encontravam em situação de insegurança alimentar. O que é isso em um país imenso, de terras férteis , o povo passando fome? Como que a gente resolve isso? O ano passado nós do MST junto a outros movimento sociais do campo, pensando essa perspectiva de aumentar a produção de alimentos, apresentamos no Congresso Nacional a Lei Assis de Carvalho, que visava além de um auxílio emergencial ao pequenos agricultores, também previa um crédito para contribuir no plantio e na produção de alimentos. O que o Bolsonaro fez? Aprovou só o nome, o restante ele vetou tudo. Porque o compromisso dele não é com a saúde do povo, o compromisso dele é com os empresários do agronegócio. É muito mais fácil ele passar recursos para plantar soja, milho, cana, do que passar recursos para a pequena agricultura onde se produz a diversidade de alimentos, o arroz, a batata, a abóbora, a mandioca, essa diversidade que a gente precisa na nossa mesa e sem veneno”, destacou Atiliana Brunetto.
A primeira noite contou com intervenções artísticas do Coletivo de Trabalhadora do SOS Corpo e da cantora e fundadora do SOS Corpo, Dulcinéia Xavier.
Na segunda noite do Seminário Mulheres Insurgentes Pela Vida e Por Democracia, realizado no dia 11 de junho, o debate seguiu com a participação de Elisa Aníbal, pela Frente Nacional Contra a Criminalização das Mulheres e Pela Legalização do Aborto, militante feminista da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB, também um membro da AFM).
A feminista falou sobre os sucessivos ataques que as forças fundamentalistas dos últimos governos, especiamente intensificados no cenário político brasileiro de pós-golpe de estado em 2016, e da luta pela legalização do aborto ser uma luta por democracia plena, superando até mesmo a perspetiva de ser apenas uma luta por direitos reprodutivos.
“Nós, movimento feminista, articulações, redes, coletivos, organizações, temos insurgido na construção de uma luta. E a luta pela legalização do aborto é uma luta de muito antes, do agora e é uma luta que vai perdurar por muito tempo. Quando a gente fale que só vamos alcançar a democracia plena quando a gente alcançar a legalização do aborto, a gente está falando que não aceita e não acolhe uma democracia que não respeita as nossas escolhas, que não respeita os nossos corpos e que além de tudo, nos assassina. Porque com a criminalização do aborto a gente tem o assassinato de mulheres, de pessoas com útero, das pessoas que gestam”, destacoi a militante feminista.
Também como convidada da segunda noite do Seminário, Creuza Oliveira, Secretária Geral da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas – FENATRAD, falou da luta por reconhecimento das trabalhadoras domésticas como categoria integrante da classe trabalhadora, e destacou a luta mais recente que a categoria estava travando, que era a da inclusão das trabalhadoras domésticas na lista de prioridades no Plano Nacional de Imunização contra a Covid-19 em todo o país.
“Temos o conhecimento de milhares de trabalhadoras domésticas que morreram de coronavírus após serem contaminadas por seus empregadores que trouxeram o vírus depois de viagens para a Europa, como foi o caso da trabalhadora que morreu no Rio de Janeiro, assim como aconteceu com outra trabalhadora na Bahia. A FENATRAD tem feito a campanha para a aprovação da Emenda nº 12, para incluir a categoria das trabalhadoras domésticas no rol de profissões consideradas como prioritárias no plano de vacinação contra a covid-19 no país. Nós queremos vacina para todos e todas, mas essa categoria que cuida de outras pessoas, que sai todos os dias de suas casas, mas que com a pandemia elas têm sido confinadas nos seus locais trabalho, algo que representa um retrocesso em uma conquista do direito de ter uma jornada de trabalho definida por Lei”, salientou Creuza Oliveira.
A segunda noite do Seminário teve também a performance poética da multiartista Cris Nascimento, e do lançamento do videoclipe de Cléa Santos, cantando a música “Separadas Pelo Rio”.
Assista a íntegra dos debates na playlist do #SOSCorpo40Anos: