Debates políticos e teóricos bastante difundidos no Brasil em geral enxergam o feminismo como um movimento composto por mulheres de classe média, brancas e com formação universitária.
Por perceber outra realidade, a educadora Carmen Silva decidiu investigar como as mulheres de classes populares participam do movimento e como se sentem em relação a esta participação. Suas questões conformaram uma pesquisa que realizou junto a integrantes do movimento, num processo que se vinculou a estudos na pós-graduação de Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco.
No percurso da pesquisa, a autora visualizou que as mulheres de classes populares sempre estiveram no feminismo e agora estão presentes em maior quantidade, organicamente vinculadas e auto-identificadas como feministas. Para Carmen, “Elas estavam lá desde o início, mas ao longo dos últimos quarenta anos a leitura que se fazia do movimento é que não permitia que essas mulheres fossem vistas”, ressalta.
No livro, Carmen Silva descreve como a mídia composta por jornais e revistas de grande circulação acentuava, há seis anos, o fim do feminismo, já que as mulheres, especialmente as mais pobres, desejam não ter que trabalhar fora de casa, para serem mães mais tranquilas, e que toda esta ideia de trabalhar fora teria sido imposta pelas reivindicações feministas. Também havia uma linha de formulação sobre a vida das mulheres sem desafios ou qualquer problema pela associação cotidiana dos afazeres “de mãe e de esposa”, com os relacionados ao trabalho remunerado numa carreira profissional plenamente bem sucedida.
A partir de sua vivência como integrante do movimento feminista, a educadora afirma seu espanto diante deste “mundo das mulheres” veiculado na mídia, por conviver com muitas para as quais o trabalho com rendimentos não apenas era desejado como imprescindível para o sustento, e realizado com a sobrecarga das tarefas domésticas, não valorizadas socialmente e não remuneradas, além dos diversos momentos de solidão, pouquíssimo tempo para si e para a participação política, estudos e outras vivências de contemplação, fruição, prazer etc. A questão do sustento e trabalho fora de casa, sempre foi, inclusive, destacado por feministas negras como uma dimensão inescapável da vida das mulheres negras, desde o processo histórico que vivenciaram no Brasil, no período da escravização e após.
Por esses aspectos e pelos interesses quanto aos caminhos percorridos pelas “articulações movimentalistas” do feminismo, Carmen Silva também buscou investigar como se organizam e as características das ações coletivas das mulheres de classe populares no âmbito do feminismo. Sua obra também pode contribuir para os estudos de todas as pessoas interessadas em analisar a movimentação feminista realizada nas ruas e na internet durante a primavera feminista de 2015.
Os principais conteúdos de sua pesquisa estão apresentados no livro “Feminismo Popular e lutas antissistêmicas”, que será lançado nos dias 13 de julho, em João Pessoa (PB), e 14, em Salvador (BA).