A Amazônia representa um terço das florestas tropicais do mundo, além de conter mais da metade da biodiversidade do planeta. O fogo gerado pelos incêndios criminosos ganharam atenção internacional recentemente. Aumento do número de queimadas acompanha o desenvolvimento do agronegócio. A destruição da floresta acompanhou a evolução do rebanho bovino na Amazônia, que passou de 47 milhões de animais em 2000 para cerca de 85 milhões atualmente. O impacto desse modelo de desenvolvimento para a Amazônia é destruidor: se na década de 1970 apenas 1% da Amazônia estava desmatada, hoje o índice chega a 20%, segundo relatório da Procuradoria do Meio Ambiente do Ministério Público Federal.
As mulheres são defensoras desses territórios e da vida na Amazônia e estão mobilizadas para resistir ao projeto de DESenvolvimento predatório da Amazônia e para construir modelos alternativos, que promovam o ENVOLVIMENTO das comunidades locais com o seu território e a proteção dos recursos naturais, que garantem a sua sobrevivência. A demarcação dos territórios dos povos originários e a defesa deles de grileiros, do garimpo, do agronegócio, da mineração, da exploração madeireira, dos megaprojetos desenvolvimentistas é a principal luta das mulheres indígenas hoje. Para elas espírito, corpo e território são elementos inseparáveis. “O território é o chão que sustenta nosso corpo; e o corpo, o lugar que abriga nosso espírito e o espírito é o que traz os encantamentos e toda a força pra gente fazer as lutas”, explica Sônia Guajajara, em entrevista para a Articulação de Mulheres Brasileiras durante a I Marcha de Mulheres indígenas que ocupou as ruas de Brasília no dia 13 de agosto. Para os povos tradicionais, não há separação entre espírito, corpo e território, só conexões. “Toda a nossa cultura vem sustentada pela ancestralidade”, diz.
O dia 5 de setembro é Dia da Amazônia e também Dia Internacional das Mulheres Indígenas
Atos em defesa da Amazônia aconteceram em diversos pontos do país. Os protestos na cidade do Macapá, capital do Estado do Amapá, no Norte do Brasil, aconteceram na praça Floriano Peixoto. Mulheres da AMB Amapá, indígenas, mulheres universitárias, estudantes e outros movimentos pela preservação da Amazônia e contra o desmatamento denunciaram o genocídio do dos povos originários.
Ato pela dia Amazônia em Ferreira Gomes, no Amapá, fez pressão contra as quatro hidrelétricas instaladas no Rio Araguari que inundou a cidade e causou destruição e impactos sociais. As mulheres da AMB homenagearam a luta das comunidades tradicionais, em especial das mulheres ribeirinhas. Estiverem presentes parceiros como o Movimento dos Atingidos por Barragens, Fospa e movimento estudantil. Foto: Articulação de Mulheres Brasileiras
No centro da cidade de Manaus, capital do estado do Amazonas, as mulheres indígenas se reuniram na Praça da Saudade para lembrar especificamente o Dia Internacional da Mulher indígena. Ressoou o eco do Fórum e Marcha de Mulheres Indígenas, que aconteceu em Brasília, de 9 a 14 de agosto. O ato começou com as músicas, cirandas e cânticos. De pés descalços, muitas guerreiras pintaram os corpos, relembrando e trazendo à vida o espírito de suas antepassadas, muitas delas foram inclusive enterradas naquela praça. Essa história foi trazida na fala da liderança da tribo Cocamo, Milena. Ela falou aos presentes: “Tem várias parentas aqui enterradas. Estamos vibrando junto com elas aqui esse dia que nunca foi lembrado, o Dia Internacional Da Mulher Indígena. Nós fizemos isso tudo em cima da hora, mas não deixamos passar. Nunca aconteceu isso, nunca foi lembrado, mas a agora vai acontecer, nem que seja com três parentas indígena, nós vamos fazer barulho”. Para as indígenas o corpo é sagrado. Ele representa a força dos antepassados, a força da luta e da resistência. “Essas pinturas corporais nos relembram como nossos antepassados lutavam para ter vida digna. Hoje ainda, em pleno século 21 ainda pintamos nossos corpos para resistir a todos os retrocessos, a todo o ataque nós sofremos há tanto tempo”, lamentou.
Fotos do Ato contra o genocídio dos povos originários, na praça Floriano Peixoto, no Macapá. Foto: Divulgação
Atividades aconteceram também no Nordeste e Sudeste do país. Como parte da campanha Nosso Corpo, Nosso Território, a Articulação de Mulheres Brasileiras, organizada regionalmente no Ceará e no Rio de Janeiro, organizaram espaços de diálogo sobre a questão indígena. O Rio de Janeiro realizou um círculo de sagrado feminino e uma roda de conversa protagonizada pelas mulheres indígenas. O encontro foi no domingo, 8 de setembro, às 14h, na Aldeia Maracanã. Já no Ceará, as ativistas feministas se organizaram para denunciar as violações e violências contra as mulheres e seus territórios durante as atividades do Grito dos Excluídos, no dia 7 de setembro.
Nosso Corpo, Nosso Território
Em defesa desses territórios, desses corpos e dessa ancestralidade, a Articulação de Mulheres Brasileiras e a Articulação Feminista Marcosur engajaram-se na construção da Campanha Internacional Nuestros Cuerpos, Nuestros Territorios, concebida durante o VII Fórum Social Panamazônico (FOSPA), realizado no Peru em 2017. Essa campanha é fruto da força mobilizadora das organizações de mulheres indígenas e amazônicas em aliança com organizações feministas para enfrentar a multiplicação das violências contra as defensoras dos territórios frente ao avanço das indústrias extrativistas.
A campanha foi apresentada no Brasil no Fórum por Inara Saterê Maué, ativista da Articulação de Mulheres Brasileiras e relembrou as parentas sobre a conexão intensa entre as mulheres e a terra: “O mundo amazônico é uma mulher!” E questionou os presentes: “Mas como é que a gente tá cuidando das mulheres? Toda vez que uma mulher sofre violência, a Terra tá sendo violentada também”, alertou a indígena. Ela encerrou a apresentação convocando todas a se olharem nos olhos, firmando o compromisso de engajamento nas mobilizações pela vida das mulheres indígenas, seus corpos territórios e espíritos. No final, todos entoaram a música “A terra é meu corpo, a água é meu sangue, o ar é meu sopro, o fogo é meu espírito”, tocaram a terra e se molharam com a água preparada pela indígena para simbolizar a proteção de todos.
O vídeo
O vídeoclipe que abre a campanha é uma realização do Cfemea (Centro Feminista de Estudos e Assessoria) e Geodésica Produções. Para conhecer mais sobre a produção, assista o vídeo documentário Encantadas – As mulheres e suas lutas na Amazônia, disponível no youtube.