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Feministas fazem brotar as sementes de Marielle Franco

Bancada Feminista cresce no Congresso brasileiro. Mulheres negras conseguem maior representatividade. Primeira mulher indígena é eleita como deputada federal. Cenário geral, entretanto, é predominantemente conservador.

 A bancada feminina no Congresso Nacional cresceu nestas eleições. Na Câmara dos Deputados, foram eleitas 77 parlamentares do total de 513, de acordo com dados finais da Justiça Eleitoral. Em 2014, eram 51. Segundo a Justiça Eleitoral, foram mais de 2,7 mil candidatas para as vagas na Câmara, número pouco acima do mínimo de 30% de candidaturas femininas exigida por lei. Em relação aos estados, Maranhão, Sergipe, Goiás e Amazonas foram os únicos que não elegeram deputadas.

O Partido dos Trabalhadores (PT) é a legenda que mais elegeu mulheres, com 10 deputadas. Em menor quantidade, outros partidos do campo progressista também elegeram suas candidatas. Agora o PCdoB possui quatro deputadas na Câmara, e o PSol, cinco. Totalizando 19 deputadas no campo da esquerda.  O PSDB e o PSL, partidos de direita e conservadores, elegeram respectivamente 8 e 7 parlamentares mulheres.

Segundo o movimento #aPartida, que mobilizou uma campanha para eleger feministas, estamos vivendo um processo emergente de ocupação da política pela nossa lógica feminista. A nota oficial celebra que “as mulheres protagonizaram (e estão protagonizando!) os atos em defesa da democracia e garantiram o segundo turno das eleições, através do movimento #EleNão. Na esquerda, os votos em feministas foram expressivos e garantiram a eleição de mulheres cis e trans em vários estados do Brasil, já se configurando como uma eleição histórica”.

No Rio de Janeiro, as três candidatas negras oriundas da Mandata de Marielle Franco se elegeram após 06 meses da execução dela, numa explícita mensagem a seus assassinos e à falta de resposta do estado, reafirmando que Marielle é e será semente. A união destas mulheres será fundamental para resistirem ao infelizmente também aumento das bancadas autoritárias da Bala e da Bíblia no Congresso Nacional.

Além delas, saíram vitoriosas candidaturas coletivas que questionam o sistema eleitoral como as Muitas, em MG, as Juntas 50180, em PE, e a Bancada Ativista em SP. Candidaturas construídas para além dos partidos, de mãos dadas com os movimentos sociais. Todas as mulheres feministas que se candidataram também fizeram história, com plataformas robustas e comprometidas, fizeram girar a engrenagem da participação política das mulheres.

A nota oficial da Partida também dá destaque às eleições de mulheres negras, “um avanço que vem iniciar uma reparação de anos de invisibilidade nos espaços institucionais e dar uma resposta ao assassinato político de Marielle Franco. Um grito que ecoa para dizer que não seremos interrompidas”. Eleita deputada estadual, Erica Malunguinho (PSol), referência do movimento negro, se tornou a primeira mulher trans a ocupar uma cadeira no Poder Legislativo brasileiro. Erika Hilton e Mônica Seixas também foram eleitas deputadas estaduais enquanto membras da bancada ativista do PSol em São Paulo. Leci Brandão (PCdoB) também foi reeleita. Na Bahia, Olívia Santana (PCdoB) tornou-se a primeira mulher negra eleita deputada estadual.

Primeira mulher indígena no Congresso

Pela primeira vez, em 190 anos de Parlamento, uma mulher indígena tem assento no legislativo brasileiro. No domingo 7, Joênia Wapichana (Rede) recebeu 8.491 votos e foi eleita Deputada Federal pelo estado de Roraima. A indígena ocupará uma das oito cadeiras reservadas ao estado na Câmara dos Deputados. A decisão de concorrer ao pleito eleitoral, segundo Joenia, ocorreu durante a 47ª Assembleia Geral dos Povos Indígenas de Roraima, após análise política sobre a situação dos povos indígenas no Brasil. Os indígenas presentes na assembleia consideraram importante a participação de lideranças na disputa institucional. Joenia Wapichana foi indicada pelo movimento indígena de Roraima e hoje une-se ao feito histórico de Mario Juruna, primeiro indígena a conquistar uma vaga na Câmara dos Deputados (1983-1987). Desde a saída do Xavante do Congresso, em 1986, nenhum indígena havia ocupado vaga no legislativo.

Em sua trajetória, Joenia Wapichana também foi a primeira mulher indígena a se formar em direito no Brasil, em 1997, pela Universidade Federal de Roraima (UFRR). “Fui a quinta colocada, onde só tinha filho de deputado, filho de dono de jornais. Mas competi de igual com eles. Acabei me formando em quatro anos, em um curso que o mínimo era cinco”, contou em vídeo para o RenovaBR, grupo do qual faz parte. Posteriormente, conquistou o título inédito de mestre pela Universidade do Arizona, nos Estados Unidos. No Supremo Tribunal Federal (STF), a indígena também protagonizou um marco ao ser a primeira advogada indígena da história a realizar uma sustentação oral durante o julgamento que definiu a demarcação da TI Raposa Serra do Sol (RR).

Conjuntura conservadora

O Brasil ainda fica atrás de dezenas de países quanto à presença de mulheres na política. Está na 115ª posição no ranking mundial de representatividade feminina no Parlamento dentre os 138 países analisados pelo Projeto Mulheres Inspiradoras (PMI), com base no banco de dados do Banco Mundial (Bird) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A lei eleitoral prevê uma cota de 30% das candidaturas para cada gênero, mas a norma é frequentemente violada por candidatas laranja. Em 2016, dos 10 candidatos com zero votos, 9 eram mulheres.

A partir deste cenário, urge maior participação de feministas na política. Isso porque a bandeira de mulheres na política também foi incorporada pelos setores conservadores, que a usaram como mote de campanha. Em São Paulo, por exemplo, a candidatura mais bem votada para o legislativo estadual foi a advogada Janaína Pascoal, autora do processo que culminou com o golpe que tirou Dilma da presidência do Brasil, além de se posicionar contra a legalização do aborto e direitos das mulheres trabalhadoras. Para o Senado, foram disputadas 54 das 81 cadeiras e eleitas sete mulheres. Duas delas, Soraya Thronicke e Selma Arruda, são do PSL,  partido de Jair Bolsonaro.

Frentes parlamentares conservadoras, cujos deputados costumam se posicionar contrariamente a pautas feministas, têm ampla base na atual legislatura. Na Câmara, a bancada da bala conta com 270 deputados e evangélica, tem 150. Ainda não é possível determinar quantos parlamentares cada bancada terá a partir de 2019, mas a ascensão do PSL, que elegeu 52 deputados, indica que nós, feministas, temos muita resistência pela frente.