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O Brasil é quilombola

O judiciário brasileiro decide que ação movida por partido de direita questionando legitimidade do direito dos quilombolas sobre suas terras são  inconstitucionais. Povo negro e indígena demarcam uma vitória histórica em defesa de seu direito à terra.

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro terminou em 8 de fevereiro o julgamento da ADI 3239, ação movida em 2003 pelo partido de direita brasileiro Democratas contra o Decreto 4.887 do então presidente Lula, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras de quilombolas. Todos os títulos de terras quilombolas poderia ser anulados, mas não foi o que aconteceu: a sessão foi encerrada com 10 votos pela constitucionalidade do decreto quilombola. O Brasil reconheceu judicialmente que o povo negro tem direito de habitar em paz e com segurança nas terras que habitam.

Uma das estratégias da direita brasileira foi criticar a regulamentação das terras por meio de decreto, defendendo que a regulamentação deveria ser feito através de lei. Em seu voto, o ministro Dias Toffoli rebateu que “a regulamentação por meio de decretos do Poder Executivo não é inválida, nem incomum, haja vista que normas procedimentais de relevância prática tem residência nessa espécie normativa, tal como a definição do processo administrativo de demarcação de terras indígenas”.

Os movimentos quilombola e indígena fizeram muitas mobilizações e ações de resistência para visibilizar a causa e denunciar a violência a que estão expostos. Com apoio de uma rede de organizações, entre elas o Instituto Socioambiental, a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas) divulgou a petição “Nenhum quilombo a menos” que conseguiu reunir mais de 100 mil assinaturas em defesa do decreto. Além disso, grandes campanhas de denúncias tomaram conta das redes sociais alertando para os assassinatos das lideranças e violência coronelista a que ainda estão sujeitas as populações negras vivendo em quilombos e os povos indígenas em seus territórios sagrados.

As força do grande capital brasileiro, representado principalmente pelo agronegócio, indústrias e mineradoras, aliado e financiando partidos e políticos de direita neoliberais, avança contra as terras e contra as lideranças dos povos quilombolas e indígenas não apenas legalmente, mas com a força do coronelismo, herança histórica da época da República Velha, onde a justiça se faz através da violência racista, colonialista e patriarcal.

O relatório «Em Solo Perigoso» da ONG Global Witness posiciona o Brasil como país mais onde mais acontecem assassinatos violentos provocados por disputas de território rural. Em 2016, os números apontam que 185 pessoas morreram em situações de violência no campo em todo mundo, só no Brasil, foram 50. A Conaq denunciou que entre 2011 e 2015, foram registrados dois assassinatos de lideranças quilombolas, enquanto em 2016 e até outubro de 2017, a violência contra as comunidades quilombolas chegou a 22 assassinatos. Dos 14 registrados em 2017, dez aconteceram na Bahia, mais de 70% do total.

Publicado originalmente em: http://soscorpo.org/o-brasil-e-quilombola/